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Começo de tudo

Música desde criança

Meu nome é João Ribeiro da Silva Neto. Nasci em São José dos Campos, São Paulo, aos 29 dias de abril de 1952. Filho de pais maranhenses, Alberto Ribeiro da Silva e Francisca Amasile Pereira da Silva.


Em São José, morava na Rua Justino Cobra, 235, na Vila Ema. A cidade, de clima frio, sempre foi muito agradável, limpa e calma. Tenho excelentes lembranças de minha infância. Alguns costumes do sul são muito diferentes dos nordestinos. Quase sempre brincava sozinho, por falta de colegas. Talvez para preencher esses espaços, minha mãe se desdobrava para me dar presentes sempre que podia. Não só brinquedos, mas principalmente livros, muitos livros. A coleção completa de Monteiro Lobato, os “Contos de Grimm”, “Contos de Andersen”, “Antes que Aprendam na Rua” e a coleção “Tesouro da Juventude”, foram meus bons companheiros. Com quase seis anos de idade comecei a estudar acordeon. Minha professora era D. Ivone, e morava a poucos quarteirões de nossa casa, na Vila Ema. Lembro-me na realidade de que ela tocava as músicas para eu ouvir e depois me ensinava a melodia. Nesse tempo eu não tinha ainda acordeon. Ficava a seu lado direito e usava somente o teclado de um acordeon de 80 baixos, da D. Ivone, de marca Scandalli. Aprendi a utilizar os baixos, que fazem a marcação e a harmonia. Depois de alguns meses ganhei de presente meu primeiro acordeon, de 14 baixos. Esse acordeon, também Scandalli, foi adquirido de um judeu, amigo do meu pai, chamado Luís Rosemberg, mediante uma troca na qual entrou até uma coleção Tesouro da Juventude, quando eu tinha 6 para 7 anos de idade.



Quando voltava da aula, a pé, vinha tocando “Rosa Maria”, que segundo meus pais era a música que eu gostava mais, talvez por tê-la aprendido primeiro. O segundo acordeon, aos 8 anos, foi presente de minha mãe Zisile, também Scandalli, mas de 80 baixos, tão grande para mim que eu não podia segurá-lo de forma correta. O incentivo e gosto de meus pais pela música foram constantes. Até o bolo de meu aniversário de 6 anos, muito grande e confeitado por minha mãe, tinha a forma de uma cítara. Na foto ao lado apareço no terraço de nossa casa, em São José dos Campos.

  • Tentativa de conseguir um milagre com música

Da infância e dos primeiros anos de música, lembro de um fato interessante, coisas de menino. Certo dia, meu pai chegou em casa trazendo um presente para mim. Cinco ou seis pintinhos, que ele ganhou não sei onde. Fiquei super animado com os bichinhos e, para curtir melhor ainda aqueles “brinquedos” coloquei-os para nadar em um tanque no quintal. Devo ter ficado ali por algum tempo me divertindo e olhando os pintinhos nadarem. Não sei porque motivo saí de perto, me envolvi com outra coisa, certamente, e esqueci aquela brincadeira. Foi o suficiente para a tragédia. Quando eu lembrei dos pintinhos e voltei correndo para continuar a brincadeira me deparei com todos eles flutuando no tanque. Morreram de cansaço pois, pela altura do tanque e quantidade de água, não conseguiram alcançar a borda e sair. A ligação desse lance com a música deu-se pelo fato de eu ter pegado o acordeon e ir para a frente de um oratório e ficar tocando desesperadamente para Nossa Senhora e pedindo que ela ressuscitasse os pintinhos. Mas infelizmente isso não ocorreu. Achava que com a música iria agradar Nossa Senhora e assim facilitar aquele meu difícil pedido.


Já em Fortaleza, por volta de 1962, quando morava perto da Igreja de Fátima, voltei a estudar acordeon com o professor João Colares, hoje maestro. Ensinava em sua própria casa, na rua Joaquim Távora, centro da cidade. Estudava uma temporada e parava outra, não por malandragem, mas por dificuldades de transporte e problemas de saúde. Quando voltava tinha que repetir o primeiro livro de novo. Não avancei o esperado, creio. Mas serviu para que eu aprimorasse o conhecimento de leitura musical.


Em 1963 ocorreu nossa mudança para Messejana, um pequeno e maravilhoso distrito a oito quilômetros de Fortaleza, de clima saudável, o que veio a constituir um marco importante em nossas vidas. Nos trouxe muita sorte e felicidade, principalmente pelo meu pai ter realizado um de seus sonhos, o de comprar uma casa própria em Fortaleza. Em princípio voltei-me para a gandaia. Muitos colegas para brincar, jogar bola e malandrar. Tudo o que faltava em São José dos Campos apareceu de repente. Aí eu passei uma boa temporada, mais ou menos um ano, sem querer saber de música. Dava um trabalho danado para a mamãe e só queria jogar futebol de salão, de campo, tudo. Fui campeão de Futebol de Salão pelo Colégio Cearense em 1965, jogando como goleiro e também como atacante. Mas em compensação fui reprovado no final do ano em cinco matérias. É como aquela velha história: para jogar, um aço, para estudar, um fracasso...


Com 14 anos fui contaminado outra vez pela música. Depois das brincadeiras de dublagens, quis aprender a tocar violão. Logo consegui adquirir um, de tamanho médio, mas não sabia nem mesmo afiná-lo. Descobri que em nossa rua, a José Hipólito, morava o Zé da Senhora, que era um jogador de futebol do Salgado da Gama, time de Messejana, que sabia tocar violão e me ensinou a afinar e a tocar os primeiros acordes. Uma de suas músicas prediletas era a Marcha dos Marinheiros. Nas primeiras semanas eu devo ter perturbado muito o Zé da Senhora, porque quase todas as tardes passava na casa dele para que conferisse a afinação do instrumento e tocasse alguma música. Daí voltava para casa e tentava repetir tudo até aprender.


Perto do campo de futebol do Salgado da Gama, em Messejana, moravam dois irmãos, que também tocavam a Marcha dos Marinheiros e outras músicas muito bem. No violão, faziam batidas de bolero e muitas outras que eu não conhecia, as que hoje em dia o pessoal acha super brega. Não se negavam a ensinar o que sabiam. Por isso freqüentei diversas vezes a casa desses rapazes e aprendi muito com eles, aos quais deixo registrado o meu agradecimento.


Naquela época os meios para o aprendizado musical em Fortaleza, particularmente em Messejana, praticamente não existiam, nada se comparando aos que existem hoje em dia, com revistas de músicas cifradas para violão, fitas de aula em vídeo e métodos para aprendizagem de todo o tipo. Naquele tempo a gente tinha que aproveitar todas as chances possíveis para aprender.


- A época das dublagens


Em Messejana, entre os anos de 1964 e 1965, antes mesmo da idéia ou pretensão de formar um conjunto musical, eu e alguns de meus colegas de infância nos reuníamos em nossa casa, na garagem, para fazer dublagens. No grupo estavam sempre o José Wellington, o Luís, o Amaury, o Sérgio e outros meninos e meninas mais novos, que faziam parte da platéia. Nós colocávamos uns discos na radiola – quase sempre compactos do Elvis Presley - e começavam as dublagens. Tinha aplausos no final e tudo, como em um show de verdade. Foram realmente bons tempos.


- As serenatas em Messejana


Mais tarde, na adolescência, após termos aprendido um pouco de violão e usado os conhecimentos de teclado do acordeon para tocar escaleta, fizemos muitas serenatas em Messejana. A escolha do repertório e o ensaio das músicas sempre foi o de mais importante.

As serenatas eram feitas com toda a tranqüilidade, pois diferentemente de hoje em dia, praticamente não havia perigo nas ruas e podíamos transitar até às altas horas da madrugada e voltar para casa sem problemas. O roteiro das serenatas passava pelas casas das paqueras, namoradas ou simplesmente de colegas. Na maioria das vezes tocávamos na casa de quase todas as garotas de nossa turma.


Após o ensaio e a definição do repertório a turma toda se deslocava pelas ruas conversando animadamente. Quando nos aproximávamos de uma das casas escolhidas para a serenata havia o momento silencioso da chegada, nem sempre tão silencioso como deveria ser, e um certo temor de que o pai da garota acordasse e reclamasse. Depois, o início das músicas e a espera do sinal, que consistia no acendimento de uma lâmpada qualquer da casa, de preferência externa, para que notássemos que a serenata tinha sido percebida. Tudo nos deixava muito ansiosos. Parecia existir uma certa magia naquilo que fazíamos.


Em uma das serenatas feitas na casa do Hugo Pompeu, que fica no lado oeste da lagoa de Messejana, quando estávamos tocando e cantando aquela música que diz assim: - Vento que balança as palhas do coqueiro... Um amigo nosso, chamado Luciano, se pendurou nas palhas de um coqueiro anão para fazer uma real sonoplastia. Resultado: no meio da música a palha quebrou e ele caiu no chão, fazendo um barulho danado. A cena marcou o fim da serenata e o começo da “farra”. Daí por diante o riso generalizou-se e a serenata não teve condições de prosseguir. Fomos embora depressa, antes que houvesse alguma reclamação por parte dos donos da casa.


No início desse período de serenatas, quando a maioria da turma tinha 15 anos, havia pureza total no que se refere às bebidas e quaisquer outros envolvimentos perigosos para a nossa idade. Drogas, nem pensar. Só mais tarde é que um ou outro fazia “uma base”, como se chamava, tomando um pouco de cerveja, mas sem nenhum exagero. Eu nunca gostei de bebidas e por isso mesmo ficava sem beber nada. Tenho certeza de que fiz bem.


Tempos depois, profissionalmente no Big Brasa, nunca tomava nada de bebidas alcoólicas. Este exemplo procurei transmitir para meus filhos, no sentido de que, na minha opinião, o músico que se preza tem que estar sempre sóbrio para melhor desempenhar sua função. Graças a Deus nunca precisei de bebida alcoólica ou de nenhum outro tipo de estimulante para tocar. Em funções no Big Brasa como guitarrista-solo, especialmente nos temas onde havia muitos improvisos, sentia muitas vezes uma sensação espetacular, indescritível, quando a própria música me elevava o espírito de forma que eu não conseguia ver ninguém naqueles momentos, parecendo estar em um mundo inteiramente novo e espetacular. Ou seja, a própria música me embriagava. Isso ocorria por vezes também em razão do ambiente em que nos apresentávamos, visto que alguns nos favoreciam com iluminação adequada, “luz negra” ou outros efeitos especiais de palco que ajudavam a “fazer o clima”. Em muitas oportunidades, completamente envolvido pela música, cheguei a fazer improvisações na guitarra, das quais no dia seguinte não conseguia lembrar quase nada.


- Como surgiu o apelido "Beiró"


Muita gente não sabe como surgiu o apelido “Beiró”, através do qual fiquei conhecido no meio musical. Foi assim: em Messejana, de 13 para 14 anos eu gostava demais de jogar bola. Fizemos um campinho de futebol num terreno em frente à nossa casa e, depois que chegava do Colégio Cearense, corria para lá e passava a tarde inteira no “racha”. A mamãe, quando tinha que me chamar, à distância, gritava “João Ribeiroooooo”, estendendo a terminação da palavra, de modo que o que se ouvia a distância era apenas o “beiroooooo”. E assim, por brincadeira, um vizinho nosso, o Pinha, começou a me chamar somente de “Beiró”, como soava o chamamento de minha mãe. Daí o apelido pegou e fiquei conhecido assim. Na foto ao lado estou posando como goleiro na rua José Hipólito, a “Estrada do Fio” de antigamente (1964).


Se no meio musical sou conhecido por Beiró, como radioamador, classe “A”, de prefixo PT7-JSN, meu nome (ou QRA) é Silva Neto, por soar mais facilmente. “QRA” significa o nome do operador, segundo o código internacional “Q”, utilizado em transmissões via rádio.


Em Brasília e no serviço público federal, no qual servi por muitos anos como Analista de Informações, ligado aos órgãos de Inteligência do Ministério do Trabalho e da Presidência da República, me chamavam de Silva Neto. No seio da família simplesmente de João Ribeiro. É este o nome que realmente gosto de ser chamado. Pudera eu ter conhecido meu avô João Ribeiro da Silva, homem bom, que desapareceu cedo, mas conseguiu deixar lembranças fortíssimas em toda a família, as quais perduram até hoje.


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